sexta-feira, 7 de novembro de 2008


...Certa vez perguntei se naqueles furos nos pedaços de lenha empilhados no cesto podiam morar anõezinhos, como aqueles dos livros de história. Claro que podiam, foi a resposta e cravou-se como um carvão em brasa no peito de uma criança de pijama na frente da lareira aos pés de seus pais.
De repente, um chiado no meio do fogo, e do furo de um pedaço de árvore saiu uma espumarada de resina aromática - apenas natural...
Mas para mim poucas coisas eram naturais.
Não consegui nem articular palavras: esperneei, chorei, estendia a mão para o fogo e, só depois de me acalmarem com colo e braços fortes e um pouco d'água, finalmente entre soluços expliquei que ali acabavam de assar vivo um dos meus anõezinhos amigos.
Assim, às vezes, nas horas mais felizes eu me desorientava: tudo o que parecia simples podia ser também estranho, e eu não conseguia sempre explicar minha ansiedade.
Então, como aquele meu anão de fantasia, tudo o que eu amava era precário e podia terminar?
Como é que nada podia ser meu para sempre, e sempre igual?
Era possível que meu amor não o pudesse preservar e proteger?
Eu não sabia ainda o que na madureza aprenderia: que todas as coisas quando acabam são substituídas por outras; que a vida não se reduz, mas cresce, e é em tudo um milagre.

Lya Luft

Mar de dentro