sexta-feira, 19 de dezembro de 2008


Chega um dia em que já não importa que tudo fique assim. num alpendre de cal sobre uma ravina. por um transtorno do pensamento. tonto. tanto. de tanto que se pensa. e não se diz. e não se faz. monólogos em círculos rápidos. incisivos. espasmódicos. e a invisibilidade das brechas. quando o pensamento não acompanha o passo. o pensamento largo e o passo curto. o espaço entre. a distância volúvel na travessia do medo. a percepção do outro em dimensões absurdas. como se alguém pudesse ser asa plana. ou luz própria de um clarão definitivo. o desacerto a ser só uma breve pausa no cume da respiração. tão imperceptível que só o ar a sustenta. enquanto se força a compreensão e derrete o gelo. e depois a vida. exposta a três dimensões. e eu plana e líquida. a encolher-me para me descolar. mas a vida é uma ravina onde escorrego e me desminto. e assim me adentro como personagem de um filme dramático. ainda tento a reconstituição de um deslumbre. as pequenas e as grandes cenas. nesta minha propensão para desfazer brumas e conspirar cenários. depois subtraio-me à ilusão e fico-me pelo movimento lentíssimo que desenha o dia a preto e branco.
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Maria José Quintela.